Cronópios Editora

Um espaço de discussão e aprendizado para professores de Língua Portuguesa.

14.2.08

Na mídia (2)

Mais um caso de "achado" na internet. Dia 16 de setembro, foi publicada no jornal O Estado de São Paulo uma entrevista com um editor chamado Lindsay Waters. Ele trabalha na Harvard University Press e escreveu um livro intitulado "Inimigos da Esperança – Publicar, Perecer e o Eclipse da Erudição" (Editora Unesp, 96 págs., 17 reais). De sua fala – muito instigante, diga-se – destaco três partes:
a) “Outro dia li no New York Times alguém anunciando pela enésima vez a morte do livro e fiquei pensando: é isso o que o mercado está dizendo? Não exatamente. O que o mercado está dizendo é que precisamos produzir livros com títulos mais atraentes, linguagem acessível e prefácios mais esclarecedores. Gasto horas discutindo títulos com meus autores e tentando persuadi-los a mudar os originais (...).”
b) “Escrevi o livro com a esperança de mudar esse estado de coisas. O modelo que as universidades adotam para a publicação de livros é o mesmo de uma fábrica de automóveis. Elas exigem produtividade, mas não exatamente qualidade. Acho que o cerne da questão são os números e a atitude reducionista dos administradores universitários. Como se pode reduzir as coisas do espírito a números? (...) Escrevi um livro propondo um movimento em direção oposta, o ‘slow reading’ (leitura lenta), para que as pessoas esqueçam essa mania de ler tudo rápido sem entender o conteúdo. Da mesma forma, se você escreve um livro por ano, não pode mesmo produzir uma obra relevante. Isso é loucura.”
c) “O editor que não quer publicar pelo bem da ecologia.”
Comentando brevemente os três pontos (há outros na reportagem), a discussão sobre a linguagem acadêmica pareceu-me fundamental. Na entrevista, fica claro que ele não está pensando em uma escrita simplista, mas em achar formas que aliem rigor intelectual e legibilidade para um público mais amplo. Já a questão da quantidade aborda um aspecto central de nossa relação com a cultura: escrever muito, mas, “por tabela”, produzir muita insignificância. Concordo novamente: não há como produzir textos realmente relevantes em intervalos de tempo tão curtos.
Por fim, conseqüência do item anterior, produzir demais, além de muita escrita que ninguém vai ler, destrói a natureza. Pode parecer um pensamento ingênuo, mas, se fizermos a conta da produção mundial de livros, dissertações e teses e de quanto papel é necessário para mantê-la, creio que chegaremos a um número assustador.
Débora de Angelo

3 Comments:

  • At 15/02/2008, 10:40, Anonymous Anônimo said…

    Eu sempre achei, em minha vida acadêmica, problemática a produção em série. Não creio que seja possível produzir qualidade se o que nos obrigam a fazer é produzir quantidade. Lixo, em muitos casos. Quanto às teses e dissertações, muitas universidades públicas (e as particulares...?) ainda exigem, por exemplo, que os trabalhos acadêmicos sejam impressos somente (para não dizer obrigatoriamente) no anverso da folha. Um absurdo, se pensarmos na quantidade de papel desperdiçado. Boa matéria, bons comentários os de Débora de Ângelo!

    Marcos Lúcio Göis

     
  • At 18/02/2008, 22:55, Anonymous Anônimo said…

    Pois é, Marcos, citando um livro de Walter Benjamin, tudo isso parece ser "Documento de cultura, documento de barbárie"... Obrigada pelo comentário e volte sempre! Abraço, Débora

     
  • At 23/02/2008, 09:47, Anonymous Anônimo said…

    Excelente post!

     

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